As discussões sobre os benefícios ou malefícios de se beber um bom vinho vêm desde os rascunhos da Bíblia.
Se o primeiro milagre de Jesus foi justamente ter transformado água em vinho nas bodas de Caná salvando a festa. Infelizmente, por outro lado, em Efésios 18, o apóstolo Paulo vai logo avisando:
“Não se embriaguem com vinho, que leva à libertinagem, mas deixem-se encher pelo Espírito”.
Eu sou de respeitar a hierarquia. Nesse caso, que me perdoe Paulo, o melhor escritor do livro sagrado, mas antes dele e seus conselhos, vem Jesus.
Ainda mais se relembrarmos o comentário do “mestre sala” responsável pela organização da festa em Caná:
"Este experimentou o conteúdo das talhas e chamando o noivo comentou: Todos servem primeiro o vinho melhor e, quando os convidados já estão embriagados, servem o vinho pior. Mas tu guardaste o melhor dos vinhos até agora!".
Ou seja, atendendo a um pedido de sua mãe, Jesus não só havia transformado água em vinho, mas num excelente vinho.
Nos dias de hoje a ciência relata uma série de benefícios que o consumo moderado de vinho traz à saúde.
O resveratrol, um dos componentes do tanino, substância encontrada na casca das uvas tintas, aumenta o bom colesterol, reduzindo o mau. A lista é grande, de fortalecer o coração a evitar a calvicie. Da prevenção ao câncer ao bem estar do fígado. O fato é que há mais de seis mil anos a humanidade é beneficiada pelo consumo do vinho.
Mas, essa conversa toda é assunto para pelo menos duas garrafas de um bom representante das Carbenet Sauvignon. Vai longe.
O que eu realmente queria destacar é a relação direta entre o vinho e a literatura. Não tenho a pretensão de dizer que o que eu escrevo aqui, nesse humilde blog, possa ser chamado de literatura, apesar de sempre ter sempre escrito com uma ou duas taças acompanhando.
Mas, grandes escritores fizeram obras primas sob o efeito de algumas garrafas.
O que posso dizer é que, incrivelmente, tudo fica muito mais bonito de se escrever ou de se lêr após uns goles de um bom tinto.
Para exemplificar, escolhi dois textos maravilhosamente escritos por dois seguidores de Baco.
O primeiro é um poema genial e bem humorado de Mario Quintana, que um dia nos lembrou: ”Por mais raro que seja, ou mais antigo,/Só um vinho é deveras excelente/ Aquele que tu bebes, docemente/Com teu mais velho e silencioso amigo.
O outro texto é de Charles Baudelaire, poeta francês, precursor do Simbolismo, que infelizmente morreu cedo, sem conhecer a fama (dizem que por consumo excessivo de álcool, vai saber). Dois textos sensacionais para serem consumidos com bons amigos e algumas taças.
“Edificante Poema Escrito em Portuñol”
Mario Quintana
Don Ramón se tomo um pifón:
bebia demasiado, don Ramón!
Y al volver cambaleante a su casa,
avistó em el camino:
um árbol
y um toro...
Pero como veia duplo, don Ramón
vio um árbol que era
y um árbol que no era,
um toro que era
y um toro que no era.
Y don Ramón se subió al árbol que no era:
Y lo atropelo el toro que era.
Triste fim de don Ramón!
Don Ramón se tomo um pifón:
bebia demasiado, don Ramón!
Y al volver cambaleante a su casa,
avistó em el camino:
um árbol
y um toro...
Pero como veia duplo, don Ramón
vio um árbol que era
y um árbol que no era,
um toro que era
y um toro que no era.
Y don Ramón se subió al árbol que no era:
Y lo atropelo el toro que era.
Triste fim de don Ramón!
“Enivrez-vous”
Charles Baudelaire
É preciso estar sempre bêbado. Tudo que faz sentido encontrará na embriaguez, esse é o único motivo. Para não sentir o peso do tempo que aproxima seus ombros e sonhos a terra, é preciso embebedar-se, sem perdão. Mas de quê? De vinho, de poesia ou virtude, a escolha é sua. O importante é manter-se bêbado.
E se despertar às vezes, na calçada da rua, na grama de um canteiro ou na solidão escurecida do teu quarto, a embriaguez já diminuída ou desaparecida, pergunte ao vento, à onda, à estrela, ao pássaro, ao relógio, a tudo que passa, a tudo que geme, a tudo que rola, a tudo que canta, a tudo que fala, pergunte que horas são; E o vento, a onda, a estrela, o pássaro, o relógio, uníssonos, responderão: “É horas de embebedar-se de novo!”
Para não ser escravo dedicado do Tempo, beba, embriague-se sem parar. De vinho, de poesia ou de virtude: a escolha é sua.
É preciso estar sempre bêbado. Tudo que faz sentido encontrará na embriaguez, esse é o único motivo. Para não sentir o peso do tempo que aproxima seus ombros e sonhos a terra, é preciso embebedar-se, sem perdão. Mas de quê? De vinho, de poesia ou virtude, a escolha é sua. O importante é manter-se bêbado.
E se despertar às vezes, na calçada da rua, na grama de um canteiro ou na solidão escurecida do teu quarto, a embriaguez já diminuída ou desaparecida, pergunte ao vento, à onda, à estrela, ao pássaro, ao relógio, a tudo que passa, a tudo que geme, a tudo que rola, a tudo que canta, a tudo que fala, pergunte que horas são; E o vento, a onda, a estrela, o pássaro, o relógio, uníssonos, responderão: “É horas de embebedar-se de novo!”
Para não ser escravo dedicado do Tempo, beba, embriague-se sem parar. De vinho, de poesia ou de virtude: a escolha é sua.

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